O Brasil precisa buscar seus atalhos

04/07/2015 21:37

Em 2012 a revista Exame acendeu uma luz amarela sobre um assunto que poderia interferir de forma direta no futuro próximo do país. Àquela altura, em um longo artigo sobre a produtividade, publicado em sua edição eletrônica, o semanário afirmava que um trabalhador brasileiro produzia apenas 22.000 dólares por ano de riqueza contra 100.000 de um americano.

Numa pesquisa rápida sobre as razões desse resultado de 2012 é possível que cheguemos a muitas explicações estapafúrdias como, por exemplo, causas históricas muitas vezes citadas para explicar os motivos da nossa locomotiva ter patinado tanto. Há sempre alguém lembrando dos perfis dos colonizadores, lá e cá, do conceito de união para formação de uma nação forte, lá e cá, entre outras coisas. No entanto, continuar a alimentar a síndrome de cachorro vira lata em pleno século XXI, ai já seria demais até para o próprio Nelson Rodrigues.

Uma coisa é certa: não temos como reescrever nossa história, mas também não há mais necessidade de aceitarmos resignados um exame de DNA feito sabe-se lá em que condições. Será que somos assim mesmo tão indolentes como ainda afirmam alguns? Irineu Evangelista, o Barão de Mauá, grande Empresário do Império no século XIX, Ricardo Semler, case de sucesso tupiniquim no século XX, e outros tantos já ajudaram a desmistificar essa ideia. Cada um ao seu tempo eles mostraram que a dedicação, disciplina e a utilização de métodos de gestão podem fazer a diferença também aqui na Terra de Santa Cruz.

Viajando de novo ao século XXI, e agora a 2015, gostaria de abordar a pouca atenção que muitas organizações continuam dando à gestão de suas estratégias. É muito comum vermos o assunto sendo colocado no “piloto automático” e tratando como um cachorro com múltiplos donos não muito comprometidos em alimentá-lo. Assim, se tudo der errado, volta-se ao lugar comum, onde é mais fácil colocar a culpa nos colonizadores.

Não dá pra dizer que patinamos por falta de conhecimento sobre o assunto, ocorre que não basta conhecer é preciso fazer. A partir dos anos 1980, sempre que alguém nas nossas organizações percebia que precisava um pouco mais de ciência e um pouco menos de achismo o ponto de partida  quase sempre era o mesmo, preparar um evento: Coffee break, abertura dos trabalhos feita por um famoso palestrante (para dar credibilidade), metodologia da moda, e promessas de amor eterno às oportunidades de melhoria que viriam.

Até hoje, é muito comum nesse primeiro evento, o palestrante alertar sobre as dificuldades do alcance do sucesso na implementação de estratégias. Quem ainda não viu aquele famoso slide mostrando que X % das empresas não conseguem efetividade na implementação de suas estratégias! Também é muito comum nesses eventos, o mesmo consultor excluir a organização dessa sina, acrescentando em tom solene que, pelo espirito de união percebido, ali o programa de mudanças será um sucesso. E os aplausos eclodem seguidos de cumprimentos por parte de todos.

Na verdade, ao citar esses percentuais de fracasso, o nobre palestrante sabe muito bem do que esta falando e bastará nos instantes seguintes, trocar meia dúzia de palavras com os gestores locais para ter certeza se o dinheiro investido em sua palestra e fará sentido naquele ambiente. A audição, por sua vez, raramente compreende o recado e valoriza mais a pirotecnia do momento, esquecendo-se que esse dia festivo já faz parte do segundo ato. O primeiro foi o desejo que alguém teve de mudar algo.

 Pois bem, passada festa da ensolarada sexta feira os gestores logo percebem uma segunda-feira chata, chuvosa e fria que insiste em lhes cobrar desempenho. Nesse momento eles se deparam com dois caminhos: 

  • Iniciam um lento, silencioso e consensual processo de fritura das estratégias traçadas e também de seus ativistas; 
  • ou levam a sério as promessas da sexta, arregaçam as mangas e começam a trabalhar.

Quando escolhem a primeira e mais tentadora opção, o caminho a ser seguido é terceirizar imediatamente as responsabilidades, minando qualquer possibilidade de que aquilo dê certo. O proximo passo é criar a ilusão coletiva de que será necessário  apenas dar partida para que o carro da Gestão Estratégica percorra sozinho todos os meandros da organização. Ele não andará nem 5 metros antes de parar  por falta de combustível, já que sua principal fonte de energia é a vontade dos próprios gestores.

A segunda opção, mais trabalhosa, tem a disciplina como direcionadora das ações. Um bom processo de gestão prescinde de pessoas dispostas a liderar processos, que não se intimidem com cobranças e, fundamentalmente, de equipes que conseguem enxergar individual e coletivamente seus papeis dentro da visão de futuro da organização. Nesse caminho não há espaço para meio termo.

Então, se o  Brasileiro é como dizem o povo mais empreendedor do mundo não podemos mais parar na página 27 (fim do capítulo I – A festa de lançamento), enquanto o livro do sucesso empresarial tem outras centenas de páginas. É preciso viver intensamente todos os dias da semana e não apenas o nascer do sol e o “happy hour” da sexta como verificamos acima.

O que não foi feito até agora já faz parte da história e os difíceis caminhos que outros países percorreram na busca da competitividade não precisam necessariamente ser percorrido da mesma forma por nós, pois, para quem não tem tempo a perder, e nós não temos, existe a obrigação  ainda maior de aprender com os erros dos outros. Essa atitude nos oferecerá atalhos muito seguros  com  ferramentas e técnicas de gestão já testadas e aprovadas. Falta-nos então a ambição de fazer o que tem que ser feito, limpamente e com competência, abandonando definitivamente essa sindrome de cachorro vira lata que tem nos acompanhado desde sempre.

Só para lembrar: Um país que teve Samuel Klein que depois de sobreviver a um campo de concentração nazista na Polônia fundou aqui a maior rede de lojas de eletrodomésticos da atualidade, onde  Senor Abravanel, o Silvio Santos,  de camelô aos 14 anos, tornou-se dono de um império invejável e onde, diariamente brotam oportunidades de norte a sul, certamente é muito mais competitivo do que tem se mostrado, só precisa desabrochar.

E por último, mas não por menor importância, lembro as sábias palavras do mestre Linhares que nos ensinou que “autoridade” se delega, mas “responsabilidade” jamais. Ela só pode mudar de mãos se alguém dela “abdicar” como fez D. Pedro I que abriu mão do trono de imperador do Brasil em favor de seu filho.

Se você é gestor, lembre-se que a responsabilidade de liderar a busca dos atalhos para um país competitivo de empresas fortes  passa também pelas suas mãos. Se não se sentir confortável no posto ceda seu lugar a outro que o queira, abdique, saia da moita, vaze, saia de fininho. Sua Empresa e o Brasil agradecerão.

Por: Abilio de Moraes Paiva