Michael Porter por Joan Magretta

09/01/2013 07:43

Nos últimos tempos, modismos convidativos e a gestão responsável têm disputado  o mesmo espaço, formando verdadeiros “nós” nas cabeças de gestores, principalmente aqueles que precisam constantemente antecipar os movimentos em favor de suas organizações. São tantas as teorias e metáforas empregadas que a realidade por vezes parece se apresentar extremamente distante e utópica.

Em seu livro Entendendo Michael Porter – HSM Editora, Joan Magretta corrige rotas, desvenda alguns caminhos e esclarece interpretações errôneas sobre os ensinamentos de Michael Porter. Entre tantos aspectos relevantes abordados na obra trago nesse artigo a discussão sobre uma expressão que nos últimos 20 ou 30 anos cristalizou-se de tal forma que tem sido interpretada, pronunciada e utilizada de forma indiscriminada e quase que irresponsável: “A Competição”.

Pensando em ser o melhor

O foco principal da questão reside no que realmente significa “competição” sob a ótica de Porter e em como ela tem sido executada por muitas figuras de destaque no mundo empresarial. Como a própria autora bem lembra, ao pronunciarmos certos termos “de tão familiares, é raro pararmos para pensar no que significam” (Ela sustenta que apenas o distanciamento do imobilismo mental é capaz de nos fazer compreender o quão capciosos são esses termos).

Ocorre que na maioria das vezes quando pensamos a respeito do conceito de “competição” somos remetidos intuitivamente àqueles apelos feitos nas empresas para se tornem as melhores e, também, nos lembramos do orgulho estampado quando se proclama que aqui ou ali é produzido o melhor produto/serviço. Conceitos, invariavelmente, reforçados por milhares de consultores com oratórias eloquentes e fundamentados nas disputas esportivas ou estratégias militares (simplesmente ninguém se dá ao trabalho de perguntar ao cliente se ele prefere o melhor ou o mais adequado à sua necessidade). É o que Porter definiu como síndrome da “Competição para ser o melhor” que, na maioria das vezes, tornam os concorrentes cada vez mais semelhantes.

Joan Magretta faz nesse sentido um questionamento interessante sobre o que seria o melhor aeroporto, considerando que terminais em cidades diferentes podem ter características completamente distintas e, ainda assim, atenderem satisfatoriamente a seus clientes. Pensando nessa lógica para o Brasil, não haveria como comparar aeroportos como o de “Congonhas” em São Paulo, cujo público provavelmente elege rapidez e agilidade como principais atributos, ao de Recife, onde os clientes possivelmente têm no conforto, espaço e a disponibilidade de boas lojas, seus maiores anseios. Como poderíamos nesse caso dizer qual seria o melhor entre eles? Da mesma forma, é também subjetivo eleger o melhor carro ou o melhor hotel para se hospedar sem que apontemos quais foram os atributos que impulsionaram tal escolha.

Segundo Porter, a utilização equivocada de conceitos fundamentais acerca do que é “competição” faz com que muitas empresas percam o foco e fracassem ao tentarem implementar boas estratégias.

Pensando em ser o único

O senso comum erroneamente transformou a conhecida expressão “vantagem competitiva”, numa espécie de curinga para significar qualquer coisa que uma organização faz bem. Fugindo desse lugar comum, a autora procura revisitar os fundamentos da obra de Porter analisando pontos que realmente proporcionam salto de qualidade às organizações, a partir daquilo que se denomina “valor único” que é facilmente percebido pelos clientes. Nesse aspecto, é perfeito o exemplo da criação em 2008 da AVE (Alta Velocidad Espanhõla) que passou a oferecer um serviço ferroviário de alta velocidade ponto a ponto entre Madri e Barcelona.

A AVE oferece velocidade, comodidade e conforto e, ainda que, cobrando preços superiores aos do transporte aéreo, satisfaz plenamente uma faixa considerável de clientes que se deslocam entre essas duas cidades, tornando o negócio viável. Enquanto as empresas aéreas espanholas que fazem o mesmo percurso continuam se digladiando em uma guerra de tarifas interminável - que diminui cada vez mais os lucros - a AVE baseou-se na inovação para obter a verdadeira “vantagem competitiva”. Essa é uma competição para ser única, onde o cliente não se importa de remunerar bem o diferencial.

Melhor ou Único

A disputa para “ser o melhor” diferencia-se, portanto, da busca do “ser o único”.

  • A primeira pode levar a uma disputa predatória balizada normalmente por atributos facilmente customizáveis empurrando os concorrentes para guerra de preços, boa a princípio para o mercado, mas em médio prazo prejudicial às organizações, seus empregados e aos setores em que elas se inserem. Observemos que nem sempre “ser o melhor” ou “o maior” representa necessariamente ter a maior lucratividade.

 

  • Já a busca por ser único eleva o padrão de produtos pela criação de valor, gerando “vantagem competitiva” que deve ser refletida nos preços, pois sempre haverá compradores ávidos a pagar mais por produtos com maior valor agregado. A Apple sempre se manteve fiel a esse tipo de estratégia e tem obtido resultados importantes nos últimos anos, mesmo sem ser a maior em seu setor.

A título de curiosidade, no Brasil dentro do setor aéreo, nas duas últimas décadas, foi possível perceber algumas iniciativas interessantes, balizadas pelo diferencial que gera vantagem competitiva. Tínhamos estratégias claramente definidas pelo “baixo custo”, “pelo conforto” e “pela pontualidade”. Infelizmente, elas têm sido perigosamente abandonadas, inclusive pelos novos entrantes, num sinal claro de desequilíbrio que pode levar o setor, em breve, a um duopólio ou quem sabe até um monopólio, reconhecidamente nefastos à competitividade.

Portanto, finalizando essa rápida reflexão a respeito da obra de Joan Magretta sobre os ensinamentos de Michael Porter, fica a afirmação maior que no mundo corporativo “é possível vencer sem necessariamente aniquilar o concorrente”.

A autora lembra:

 “A concorrência empresarial é mais complexa, ampla e multidimensional e pode admitir mais do que um vencedor.” “Dentro de um setor podem existir diversas disputas baseadas nos tipos de clientes e necessidades a serem atendidos.” “Estratégias diferentes num mesmo setor aperfeiçoam esses vínculos e criam vantagem competitiva.”

 

Joan Magretta colabora com Michael Porter há duas décadas. É associada sênior do Instituto de Estratégia e Competitividade da Havard Business School, ganhadora do McKinsey Award e autora de O que é a gestão, eleito livro do ano pela The Economist. Foi sócia da Bain & Co. e editora de estratégia na Havard Business Review.

Por: Abilio de Morais Paiva